Por Elis
Franco
Outro dia, estava eu deitada
no sossego do meu quarto, quando minha filha caçula, depois de eu ter enchido
a paciência dela para deixar um pouco de lado a televisão e o tablet, apareceu com um inseto preto e
branco, o qual chamou de “joaninha” (e eu não falei nada porque achei que era
uma joaninha mesmo, mas que na verdade é mais conhecido como “soldadinho”), perguntando-me
empolgada se ela poderia cuidar dele “pra sempre”. Era uma alegria tão contagiante,
que me fez levantar para observar aquele pequenino ser, tão delicado, pousado
sobre uma folhinha verde que ela trazia em uma das mãos.
Rapidamente, mais rápido do
que eu poderia supor, afirmei que ela poderia cuidar sim do pequeno bichinho.
Eu só não esperava que ela fosse pedir para colocá-lo em um vaso com tampa, a
fim de que o precioso animalzinho não fugisse de seu poder. Confesso que não
pensei muito para responder e disparei algumas informações, em um tom de voz
meigo e cuidadoso, pois tudo que eu não desejava era acabar com o brilho existente em seus olhos.
– Minha querida, você poderá
ficar com ele, mas não deve aprisioná-lo, porque se ele ficar sem oxigênio, irá
morrer.
– E o que eu faço, então? Falou
com ar meio triste.
– Você deve cuidar dele,
ficar com ele, até o dia em que ele desejar. Uma hora ele precisará voar
novamente e você terá de permitir. O “pra sempre” acabará nesse momento.
Ao contrário do que eu
esperava, a danada balançou a cabeça em sinal afirmativo, partindo do quarto
feito louca, talvez para aproveitar o máximo de tempo que seria o sempre do
soldadinho. Só aí eu percebi que, sem querer, havia ensinado a ela a sua
primeira lição sobre o amor. Uma lição que pareceu a ela tão simples, tão fácil
de ser executada, mas que para nós adultos, é cheia de impasses e dificuldades de
assimilação.
Quando aquele momento
passou, eu nada mais soube sobre a joaninha dela. Não me lembrei de perguntar,
ou não quis, sei lá! Um dia, provavelmente, eu terei de conversar sobre outras
lições amorosas. Voltarei a falar sobre o pequeno inseto da infância e
mostrarei que, em uma tarde qualquer, ela havia aprendido a primeira lição
sobre o amor. Mas aí ela será jovem ou adulta e, infelizmente, talvez não
consiga mais ter a mesma reação que teve quando criança.
15/03/15
Publicado em: FRANCO, Elis. Memórias afetivas. Salvador: Cogito, 2018. p. 13 e 14.